Ilhas Marquesas
Sábado, 7 de junho de 1996. Vigésimo segundo dia da
travessia desde que saímos do Hawaii. Sem tempestades, mar e ventos
tranqüilos todo o tempo. Avistamos as sombras da Ilha Nuku Hiva às quatro
da manhã, o portal de entrada para a Polinésia Francesa. Mais tarde, já
estávamos dentro da baia de Taiohae, um dos lugares mais gostosos de Nuku
Hiva.
Antes de chegarmos nas Marquesas assistimos ao "Green
Flash", um fenômeno que acontece no ocaso quando a última réstia de luz
produz efeito tipo refração, algo assim, que provoca a aparição de um raio
verde por fração de décimos de segundos. É belíssimo e nem sempre ocorre.
Há que existir uma série de características peculiares para que tal
fenômeno ocorra.
Taiohae lembra muito a praia da Ferradurinha, em Búzios.
E é como se ainda tivesse a cidade e as montanhas de Friburgo (Rio de
Janeiro). Ou seja, praia e montanha juntas. Dá para se ter uma idéia do
paraíso.
O arquipélago das Marquesas é composto de quinze ilhas e pequenos motus - atóis - no sentido NO/SE, entre as latitudes 8º S e
10º30 S e a longitude 140º W. As ilhas são de formação vulcânica, muito
altas e com belíssimas falésias. As Marquesas são as ilhas mais ao norte
da Polinésia Francesa e o ponto de entrada de quem vem do canal do Panamá,
América do Sul ou Hawaii.
A população deste arquipélago está, hoje, em torno de
seis mil habitantes, remanescentes de uma população de cerca de sessenta
mil habitantes, exterminados por seus colonizadores. O clima é quente,
ficando em torno dos trinta graus centígrados o ano inteiro. As chuvas são
regulares, o que favorece em muito a vegetação e a agricultura.
O centro administrativo é em Nuku Hiva (mas, os papéis
de entrada também podem ser feitos em Hiva Oa ou na ilha de Va Pou). A
moeda local é o franco polinésio e aceita-se, em todo o comércio, o dólar
americano. Mas cuidado, aqui tudo é caríssimo. Os gastos devem ser
programados e controlados, principalmente os inerentes à manutenção do
veleiro. Em todo o canto só se fala o francês, é o idioma local. Por
vezes, no comércio, o pessoal fala inglês (lembrando que na Polinésia
Francesa, das doze às quatorze horas tudo fecha).
Em Nuku Hiva, e em todas as Marquesas, existem frutas em
abundância e são facilmente colhidas, desde que, inicialmente, se peça
autorização aos proprietários do terreno. Eles se sentirão honrados e se
tornarão gentilíssimos, prestativos e atenciosos, deixando apanhar o que
se quiser e na quantidade que se quiser. Existe todo o tipo de frutas,
algumas que não conhecemos como a 'pome e tóile' que lembra o caqui e a
'pamplemousse' (uma espécie de grapefruit), laranjas gigantes que são
comidas com uma colher. Também há muito coco, só que com mais água, e
fruta-pão, símbolo do Banco Socredo, onde se faz o câmbio.
O povo marquesiano é muito alegre, principalmente as
vahines (mulheres). As mais bonitas são fruto da miscigenação do polinésio
com o chinês, resultando numa mulher belíssima, esbelta, de cabelo liso e
olhos puxados. Já os tanes (homens) são desconfiados e custam para fazer
amizade. No caso dos brasileiros, tudo fica mais fácil: eles estão
descobrindo o futebol, o samba, o carnaval e vêm logo atrás de
informações. A alegria, as festas, o calor, temos muito em comum. Os
marquesianos são caçadores - a caça faz parte de sua tradicional cultura.
Só que, atualmente, não é mais a caça feita com lanças, flechas ou tacapes
e sim com rifle 22.
Ao norte de Nuku Hiva, existem duas baías que não se
pode deixar de visitar: a baía de Anahou e a de Atieu. A primeira é
belíssima, com excelente ancoragem e protegia dos ventos. Já Atieu não é
tão protegida. Mas em ambas podem ser pescadas lagostas, polvos e peixes,
aliás em todas as Ilhas Marquesas. O mergulho em Nuku Hiva, entretanto,
não é muito bom. O peixe está muito no fundo e há muitos tubarões,
especialmente o martelo e o tigre gigante. Além disso, há o problema da
ciguatera, uma doença que dá nos peixes e pode matar o ser humano. É um
veneno do tipo cumulativo. Aprendemos que peixe de passagem e prateado não
têm ciguatera. O maior índice desse veneno está nos peixes de toca, que
vivem nos corais, como o badejo, garoupa, dentão etc.
Para quem gosta de tatoo, a Marquesa é o local. São os
melhores tatuadores e os desenhos simbolizam, em geral, as histórias
locais.
Todos os veleiros estrangeiros devem sair da Polinésia
Francesa até o fim de outubro impreterivelmente, pois na época dos
furacões (de dezembro a março) eles não querem se responsabilizar por
ninguém. Acabamos, em nossas andanças, tendo certeza de que poucos
veleiros brasileiros pintaram na Polinésia, não mais que vinte, se tanto!
De Nuku Hiva fomos para Hiva Oa. Saímos ao anoitecer e
chegamos pela manhã na ilha onde Paul Gauguin, o grande pintor francês,
viveu seus melhores dias. Aportamos na Baía de Taahuku, o único local
seguro de se aportar. A baía fica afastada do centro da cidade e o
expediente é pedir carona, que o pessoal prazerosamente oferece. O
interessante em Hiva Oa é conhecer o museu Gauguin. E também a réplica de
sua casa, que hoje virou um centro onde artistas vendem pinturas, desenhos
e esculturas.
De Hiva Oa seguimos para Fatu Hiva, distante meio dia de
velejada. Saímos cedo pela manhã e às doze horas estávamos fundeados na
baía das Virgens - Hanavave. Fatu Hiva tornou-se para nós a mais bela de
todas do arquipélago das Marquesas. Boa para o mergulho, para a prática de
surf e para a pescaria. Ainda em Fatu Hiva, conhecemos a baía de Omoa. Lá,
há uma praia próxima onde rolam as melhores ondas de todas as Marquesas.
De Fatu Hiva, partimos no dia 24 de junho deixando as
Marquesas rumo ao arquipélago de Tuamotus. Destas maravilhosas ilhas,
portal de entrada da Polinésia Francesa, ficaram as lembranças de um local
belíssimo.
João Sombra
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